Os benefícios da aprendizagem intergeracional

O aumento da longevidade dos indivíduos, decorrente da diminuição da taxa de mortalidade e do aumento da esperança média de vida, potencia uma maior relação entre as gerações, estando subjacente uma consciência coletiva de solidariedade (intergeracional), princípio consagrado no sistema da segurança social. Contudo, o caminho da solidariedade tem de ir muito para além da segurança social, sendo um dos atuais desafios da sociedade despertar a motivação para a permuta do conhecimento entre as gerações. Nesse sentido, define-se a aprendizagem intergeracional como uma partilha recíproca de conhecimentos entre pessoas de diferentes idades, em que as gerações trabalham em parceria para integrarem conhecimentos, valores e competências. Essa partilha visa um mútuo benefício na capacitação e desenvolvimento dos indivíduos em diversas esferas na sociedade (ENIL, 2012).
O conhecimento é inesgotável e por esse motivo não está balizado cronologicamente nem se restringe a uma fase da vida. Assim, torna-se incerto o modelo tradicional do percurso de vida em três fases “estanques”: a aprendizagem na infância e juventude; a produtividade no decurso da vida ativa; o descanso/lazer na reforma. A trajetória de vida deve ser perspetivada através da interligação das três fases, onde a aprendizagem está inerentemente presente. Por conseguinte, considera-se a aprendizagem intergeracional como parte integrante da aprendizagem ao longo da vida que é "toda a atividade de aprendizagem em qualquer momento da vida, com o objetivo de melhorar os conhecimentos, as aptidões e competências, no quadro de uma perspetiva pessoal, cívica, social e/ou relacionada com o emprego” (CCE, 2001).
A aprendizagem intergeracional é propícia a decorrer em diversos contextos (escolas, universidades, empresas, centros comunitários, lares, associações e coletividades). No entanto, tende-se a privilegiar as atividades de índole não-formal e informal, funcionando como um complemento às práticas formais das instituições educativas. A educação não-formal é um processo de aprendizagem participativa e voluntária que, apesar de não visar formalmente a certificação, é estruturada com vista a atingir objetivos educativos. A educação informal está relacionada com o que se aprende e o que se partilha espontaneamente no dia-a-dia, não sendo organizada ou norteada por objetivos previamente definidos.
A aprendizagem intergeracional resulta em benefícios para as crianças e jovens, para os idosos e para a comunidade. De seguida, tendo em conta os resultados de práticas e de respostas sociais que integram e promovem a intergeracionalidade, partilham-se os principais benefícios (Bressler, Henkin & Adler, 2005; MacCallum et al., 2006; Rebelo, 2015):
Benefícios para as crianças e jovens:
- O apoio dos idosos às crianças e aos jovens através do acompanhamento da vida escolar e nas atividades lúdicas, contribuem para mantê-los ocupados de forma saudável, evitando o envolvimento em situações de comportamentos antissociais;
- A “escola da vida” (tradições, cultura, saberes e vivências) partilhada para os mais novos contribui para estes terem uma perceção de maior valorização do papel dos idosos e de compreensão do processo de envelhecimento;
- A transmissão de conhecimentos práticos em diversas áreas (ex. Agricultura), potencia o aumento da capacidade de relação de conceitos e de adaptação das crianças e jovens a diferentes contextos da vida pessoal e profissional;
- A atenção e a dedicação de tempo dos idosos, que por vezes os pais não conseguem disponibilizar por motivos profissionais, suscitam nos mais novos o sentimento de que podem ter um “ombro amigo” em momentos de maior dificuldade, sobretudo pelos conselhos decorrentes da experiência de vida dos seniores.
Benefícios para os idosos:
- Os seniores recordam e vivenciam uma “nova infância” pela oportunidade de usufruírem de mais tempo e com melhor qualidade na interação com os mais novos, situação, porventura, não desfrutada de igual forma no passado com os seus filhos;
- Ao estarem ativos, os idosos evitam a solidão, melhoram a saúde e a satisfação com a vida, suscitando um sentimento de utilidade e de realização pessoal no seu papel de suporte aos mais novos;
- Perante situações de fragilidade de saúde e de perdas relacionais dos idosos (ex. viuvez) a interação com as crianças e os jovens permite ajudar a recuperar o equilíbrio emocional;
- A partilha de conhecimentos dos mais novos permite um incremento das competências linguísticas e digitais dos seniores, contribuindo para uma maior participação dos idosos na sociedade.
Benefícios para a comunidade:
- Desenvolvimento do sentimento de comunidade, através de uma maior colaboração voluntária de pessoas e envolvimento de organizações na resolução de assuntos comunitários;
- Construção de redes sociais e fortalecimento de laços de solidariedade;
- Diminuição dos estereótipos e de clivagens de conhecimentos, da história e da cultura entre gerações;
- Alívio da pressão parental, permitindo um maior equilíbrio entre trabalho, família e lazer dos pais. Simultaneamente, contribui para um crescimento saudável das crianças e dos jovens e para o aumento da qualidade de vida dos seniores.
Para finalizar, importa referir que as transformações etárias da população vão conduzir à necessidade de políticas locais que promovam respostas sociais voltadas para a aprendizagem intergeracional. Naturalmente que não existe um modelo único, pois depende da realidade local e da forma como se integra em rede o conhecimento produzido. Para além disso, tem-se assistido à reconfiguração dos perfis sociais do “reformado”, do “trabalhador” e do “aluno”, podendo, inclusive, o mesmo indivíduo desempenhar os três papéis em simultâneo (reformado que mantém uma atividade profissional e académica), motivo pelo qual os programas intergeracionais devem ajustar-se à evolução dos papéis sociais nas diferentes gerações.
Artigo de Bruno Rebelo
Bibliografia
Bressler, Jeanette, Nancy Henkin & Melanie Adler (2005), Connecting Generations, Strengthening Communities: A toolkit for intergenerational program planners, Philadelphia, Center for Intergenerational Learning, Temple University.
Comissão das Comunidades Europeias (2001), “Tornar o espaço europeu de aprendizagem ao longo da vida uma realidade”, Bruxelas.
European Network for Intergenerational Learning (2012), Report on Intergenerational Learning and Active Ageing, Lifelong Learning Programme (Grundtvig), Brussels, European Commission.
MacCallum, Judith, David Palmer, Peter Wright, Wendy Cumming-Potvin, Jeremy Northcote, Michelle Brooker & Cameron Tero (2006), Community building through intergenerational exchange programs: Report to the National Youth Affairs Research Scheme, Australia, National Youth Affairs Research Scheme (NYARS).
Rebelo, Bruno (2015), Universidades Seniores: Uma visão sobre o Envelhecimento Ativo, Porto, Edição Mais Leitura.